Todas as minhas idas a médicos, nos últimos anos, fornecem uma visão apocalíptica sobre a medicina, pois praticamente sempre os médicos tem feito observações erradas (cujo erro só descobrimos depois) e receitado remédios inócuos.
Há alguns dias tive COVID e o médico, apresentando-se como neurologista, me receitou: Azitromicina, um Xarope e Dipirona. O diálogo sobre a azitromicina foi simplesmente surreal:
– Esse remédio aqui, azitromicina, é um anti-inflamatório?
– Não, ele é antibiótico.
– Mas COVID… não é vírus?
– É um vírus, mas azitromicina é antibiótico
– E…
– E apesar de azitromicina ser antibiótico, há experimentos que demonstram que ele diminui a população dos vírus COVID. Além disso, receitei a você um xarope, que é antiviral.
Não consegui saber que tipo de reação adotar, pois o médico estava praticamente rindo da minha cara. E pior: rindo sério. Pois xarope não é antiviral, e sim expectorante. E azitromicina não diminui a população do coronavírus em situações clínicas nem aqui, nem na China.
O médico estava simplesmente repetindo a lorota bolsonarista que fala daqueles experimentos nos quais, em situação laboratorial, uma solução hiperconcentrada de cloroquina, ou de azitromicina, levou à diminuição do coronavírus. Pois bem: nos mesmos experimentos, doses menores de leite levavam ao mesmo… Mas nenhum médico passou a receitar leite para COVID, pois sequer isso faria sentido.
Medicina de protocolo
Por que isso ocorre? A resposta mais clara é o tipo de medicina e de educação médica que se tem adotado nos últimos anos a partir das faculdades particulares, com seus programas pré-formatados, ensino online e experiência clínica “presencial” reduzida.
Ao invés de aprender medicina – a tradição médica de clínica e de experimento, que leva o conhecimento de anatomia, fisiologia e patologia à clínica seguindo tradições como a de Claude Bernard e outros -, um estudante de medicina cada vez mais aprende protocolos semelhantes aos que oferecem os seguros de saúde. Não se tem mais o cultivo de um conhecimento profundo do corpo, e sim de protocolos nos quais para certo acometimento, recomenda-se certo encaminhamento.
É assim que um médico pode receitar azitromicina para COVID sem isso fazer qualquer sentido.
É assim por meio disso, também, que temos cada vez mais a seguinte experiência:
Vamos a um médico que sequer dá uma resposta à nossa doença. Quando muito, ele fornece uma espécie de ensaio de tentativa e erro: receita um remédio e pede para ver se vai funcionar, com a condição de que, não funcionando, voltemos alguns dias depois. Ou ainda: o médico não dá uma resposta e nem encaminhamento, receitando, soltamente, algum remédio.
Saímos desse médico com a impressão de que nós é que deveríamos ter sido formados em medicina para sermos capazes de escolher um médico que diagnostique e encaminhe nossa questão.